Este é o episódio zero do podcast Vozes da Unilab em uma nova série especial que busca alertar e divulgar iniciativas de combate a pandemia do COVID-19. Nosso foco na série é dialogar com os espaços africanos na África e na diáspora.
O Vozes da UNILAB é um podcast desenvolvido na Universidade da Integração da Lusofonia Afro-brasileira, como parte do projeto de pesquisa e extensão botAfala.
Neste episódio, vamos tentar descrever um pouco sobre como o hip-hop tem servido como uma ferramenta de combate ao COVID-19 nos espaços africanos. Ouça sua voz!
Este é um episódio modelo. Para que o projeto ganhe força e continue precisamos de sua colaboração: divulgue, compartilhe e comente com pessoas da sua comunidade e nas redes sociais. Você pode encontra mais informações sobre este episódio, links e referências no site vozesdaunilab.unilab.edu.br. Estamos também no Facebook, na página facebook.com/vozesdaunilab/
Se você quiser reproduzir os episódios do podcast vozes da unilab em sua rádio web, rádio comunitária é só entrar em contato com a gente. O email é vozesuni@gmail.com.
Para dar uma força para o projeto, avaliem e deixe seu recado na página do podcast no itunes. Avaliações positivas nos garantes mais visibilidade e ajudam outras pessoas a encontrar nosso trabalho. Deixe seu comentário, compartilhe com amigos e ajude a melhorar nosso projeto. Ouça sua voz!
Divulgamos aqui o texto base do episódio para que a ouvinte tenha acesso aos links e canções citadas e possa multiplicar a utilidade desta iniciativa. Professores que queiram utilizar o episódio como mote para sala de aula entrem em contato com a gente e solicitem o beat que foi feito por Eugenio da Silva Evandeco (MenteCriativa) especialmente para este episódio. No site disponibilizaremos uma versão preliminar do beat para os interessados: a contrapartida e a referência, citar a fonte e seguir em frente!
O hip-hop geralmente é descrito a partir de 4 elementos: o M.C. , o D.J., o grafite e a dança dos b-boys. Essa divisão é questionável, já que em vários lugares do mundo podemos encontrar a prática do hip-hop sem algum desses elementos. O grafite mesmo tem uma história própria que não pode ser reduzida ao hip-hop. Em espaços e momentos diferentes outros fatores e práticas ganham destaque (como as batalhas de MC’s ou concursos de dublagens) de acordo com acesso a tecnologia e a fatores culturais. Para além da enumeração de elementos, o mítico pioneiro Afrika Bambaata, foi quem destacaou a importância e um quinto fator: o conhecimento. A busca pelo conhecimento amarra e dá sentido aos outros fatores transformando-os numa saga de autocriação, de conversão de si mesmo e da comunidade. Pouco importa quais os elementos que você considera fundamentais no movimento hip-hop: sem o compromisso radical com a comunidade e a busca por conhecimento o jogo não faz sentido! Por isso, diante do desafio da COVID-19 que pede mudança de hábitos e consciência, o movimento hip-hop tem se mostrado uma ferramenta política importante para falar diretamente aos jovens.
Em África e nas tradições marcadas pela cultura africana na diáspora, os momentos de dor muitas vezes são mote para a construção de canções que promovem práticas de resistência. A canção realinha nosso ritmo na direção de uma mudança de hábitos e disposições. Isso não foi diferente quando o objetivo era combater a propagação de doenças contagiosas: no anos 8—90 o cantor Philly Bongoley Lutaay fez sucesso com uma canção que alertava para o combate a AIDS e no contexto atual o presidente da Libéria George- Weah se juntou a artistas do país para gravar uma canção de prenevenção a Covid-19, chamada Coronavirus-Song (https://www.youtube.com/watch?v=ll3UKkdBs9k).
No Brasil, o rapper MV Bill lançou a canção Quarentena destacando a necessidade de consciência para mudar hábitos no combate á pandemia. O rapper descreve as ruas vazias, é destaca que é “assim que tem que ser”, mas de modo mais forte negrita o desafio de quem vive na periferia, seja em sambizanga, mindará ou Cajazeiras, “pra nós a COVID é diferente/ As casas não são grandes e geralmente tem muita gente/ Aglomeração inevitável/ Alguns lugares ainda não tem água potável”. MV Bill descreve a necessidade da quarentena para que a curva de contaminação se amenize. Já sabemos que faltará espaço nos hospitais, por isso é preciso se prevenir, lavar as mãos, evitar contato com as mucosas. Mais do que nunca é necessário ter inteligência pra não cair no discurso que ostenta ignorância e arrogância, mas que não valoriza a vida. MV Bill anuncia a máscara de quem pensa assim já caiu, não é mais quem comanda a gente…
Diversas organizações sociais ligadas ao movimento hip-hop têm trabalhado nas favelas e comunidades da periferia das grandes cidades do Brasil; coletivos de grafite também têm criado imagens que alertam sobre o problema. Enquanto isso, nomes importantes do cenário do hip-hop nacional como GOG e Emicida promovem lives dialogando sobre temas diversos e desafinando o coro dos contentes. Emicida até lançou um podcast em que vai descrever o jogo de referências que estão persentes em seu álbum mais recente, AmarElo. São muitas iniciativas, difíceis de rastrear todas. Este podcast, por exemplo, é uma delas. Mas o hip-hop já havia sido utilizado como ferramenta de conscientização desde o início da pandemia.
Em Portugal, já no começo de março o influente youtuber Miguel Paraíso fez paródias tratando do Coronavírus num tom humorístico que com o avanço da doença se mostrou inadequado. Em termos mais cuidadosos, em Guiné Bissau o Projeto SCV (ALL B, CALI MC, FILTROS & PIAZZA PRINCE) (https://www.youtube.com/watch?v=NRUZwy8Ccg0 ); Movimento Nova Ordem e (https://www.youtube.com/watch?v=mLvgPBHREwI) King Klever – Coronavírus (https://www.youtube.com/watch?v=HQOr98A4Uko ) foram alguns dos artistas que lançaram canções sobre a pandemia. Em Angola a “Dança do Corona” trouxe o afrohouse pro combate ( Dj Akam-M, Dj Guileu Cabral, Pink 2 Toques e Bruno Samora)(https://www.youtube.com/watch?v=8cqxDoBOOZU) e o Projecto Os Kuduristas lançaram Únidos Contra [Covid-19] CoronaVírus (https://www.youtube.com/watch?v=OmLIryz8mt8)
“Ouvi falar desse novo coronavírus se espalhando na velocidade da luz. Respirar esse vírus causará pneumonia sem custos, talvez sem sintomas óbvios por 14 dias. O próximo passo é a alta temperatura corporal, tosse, dor de garganta, dificuldade pra respirar”, estes versos, mais parecem um tipo de guia médico, fazem parte de uma canção lançada em fevereiro por Percy Akuetteh. O rapper de Gana faz doutorado em medicina na Universidade de Wenzhou na China, e fez este rap em mandarim para alertar sobre como se prevenir do coronavírus (http://www.youtube.com/watch?v=Brf7g_w1T5M).
O rapper dominicano Yofrangel também foi um dos primeiros a alertar para o Coronavirus, ao lançar no começo de Janeiro a canção Corona Virus (http://www.youtube.com/watch?time_continue=19&v=uF3dg5seGLs&feature=emb_logo). No entanto a canção e o clipe de Yofrangel causaram polémica, talvez pelo alcance da pandemia ainda limitado no momento o cantor tratou com tom humorístico o problema, alcançando mais de 7 milhões de visualizações no youtube. Há menos de uma semana Yofrangel lançou uma continuação de sua primeira canção e vídeo-clipe: a canção fala sobre a quarentena (http://www.youtube.com/watch?v=xM3-LcF-uwU).
O rapper ugandense Bobi Wine junto com o músico Nubian Li lancçou a canção Coronavirus alert que já tem mais de 750 mil visualizações no youtube. A letra alerta de modo didático que existem boas e más notícias: “ a notícia ruim é que qualquer pessoa é uma vitima potencial/ A boa notícia é que qualquer pessoa é uma solução potencial/ sensibilize as massas para a higienização/ manter a distância e a quarentena”, a letra mantem o sentido pedagógico, de que a prevenção é mais fácil do que a cura, por isso é preciso “Disciplina e higiene pessoal/ lembrando-se de lavar regularmente as mãos, / manter distância de todos / e informar se tiver sintomas. / Febre alta é um sintoma. / Tosse seca é um sintoma. / Inclusive espirrar pode ser un sintoma…”. Também de Uaganda Ykee Benda reuniu vários artistas (King Saha, Joanita Kawalya, B2C, Dre Cali, Feffe Bussi, Myco Ouma, Jose Sax) para produzir a canção CORONA (http://www.youtube.com/watch?v=a44VHZt6f-Q). Já a cantora Spice Diana se uniu a Fik Fameica para produzir a canção Corona (http://www.youtube.com/watch?v=Lre39_uzVoo).
Mas não se trata só de trazer novas canções, mas de cantar e dar voz para os sem voz. Muitas vezes usando línguas que não são oficiais no país.
Théa Ollivier, em reportagem para o Le monde no dia 30 de março, descreveu como o hip-hop do Senegal vem se mobilizando para alertar a população sobre a necessidade de prevenção em relação ao COVID-19. O país vive em situação de estado emergência desde do dia, com toque de recolher entre as 8 da noite e as 6 da manhã. Nesse contexto, o hip-hop é uma importante ferramenta para disseminação de informações, já que a maioria da população do país é de jovens com menos de 19 anos.
A mobilização acontece tanto pela criação de imagens através do grafite, que no espaço publico reconfigura o cotidiano destacando o momento de luta contra a pandemia, quanto através da criação de canções e clipes. O coletivo RBS Crew grafitou os muros da Universidade de Dakar com imagens que alertam sobre a ameaça do COVID-19 e destacam práticas de prevenção. Nas palavras de Madzoo, um dos membros do coletivo: “Nossa arte está comprometida com o serviço da população, estamos acostumados a lidar com problemas sociais, políticos e religiosos”.
O grupo Y’en a marre lançou em 19 de março a canção “Fagaru Ci Coronavirus” (http://www.youtube.com/watch?v=06YbY1MLp4A), que cantada em wolof traz o compromisso de unir as pessoas nestes tempos de crise, algo que faz parte do espírito do hip-hop. O Y em marre já havia feito canções para outros momentos de crise, como a do Ebola (Stop Ebola, Senegal http://www.youtube.com/watch?time_continue=2&v=f2tARLMyvJc). Nas palavras de Simon Kouka, um dos líderes do grupo “O hip-hop é uma alavanca política muito poderosa e é facilmente compartilhada nas redes sociais”. O grupo se mobilizou para distribuir álcool gel e mascaras em escolas corânicas, lojas e transportes, mas também procurou validar as informações que traz na canção junto ao ministério da saúde do Senegal ressaltando os avisos que valem para todos neste momento de lavar às mãos, evitar reuniões e saudações; tossir no cotovelo, usar um lenço e descarta-lo no lixo. Além disso, o rapper Simon Kouka negritou a necessidade de cuidado na busca de informações e ao perigo de tomar como fontes válidas as redes sociaisa, explicou ao jornal Le monde: “Os jovens devem evitar acreditar em todos que se levantam como especialistas e enganam as pessoas. O melhor é nos unirmos e seguir as instruções do ministério “, enfatizou.
O rapper Ngaaka Blinde, junto com um grupo de rappers também lançaram uma canção sobre o COVID-19 (http://www.youtube.com/watch?v=URUPLZjjj0Q), que apesar de ser uma iniciativa que não parte do estado, usa um trecho de fala do presidente durante a canção enfatizar a necessidade de união neste momento de pandemia. Cantando em wolof, em dialogo com o pop africano, de Bril e Bass Thioung, lançaram em 23 de Março a canção «Noy Moyto Corona» («comentário sobre a corona»), que já tem mais de 90 mil visualizações no YouTube desde 23 de março. (http://www.youtube.com/watch?time_continue=2&v=ph4d6mSVvp4&feature=emb_logo).
A reportagem de Thea Ollivier destaca que, neste momento, a crítica social e as divergências políticas cederam lugar para uma mensagem que tem um valor comum e é urgente: a prevenção da pandemia. Nesta luta o hip-hop repercute certa sabedoria que aparece em um provérbio nigeriano: “Até que o dente podre seja arrancado, a boca deve mastigar com cuidado”.
Podcast: Play in new window | Download